Canteiros de uma obra bilionária, iniciada há cinco anos para levar
água ao semi-árido nordestino, estão abandonados. A repórter Mônica
Silveira mostra que o atraso na transposição do Rio São Francisco é
visto com tristeza por quem enfrenta a pior seca dos últimos anos na
região.
Outro de dia de sol implacável. Os sertanejos quase não conseguem
sustentar a esperança que invadiu o coração deles cinco anos atrás.
“Eu não tenho esperança dessa água chegar aqui não, viu?”, diz a agricultora Maria da Paixão Souza Marques.
A obra para salvar 12 milhões de nordestinos da falta de chuva começou
em agosto de 2007. Pela previsão inicial, até o fim de 2012 a
transposição estaria concluída. Ela levaria água do São Francisco a
municípios de quatro estados por dois canais de concreto, chamados de
Eixo Norte e Eixo Leste. Mas hoje, trechos de canal que já tinham sido
concluídos estão rachados e precisam ser refeitos.
No caminho da transposição fica Sertânia, 34 mil habitantes com sede. O
nível da água do reservatório da cidade está reduzido a 4,5%. Ele fica
bem ao lado dos canteiros que as construtoras abandonaram, alguns ainda
cheios de máquinas encaixotadas. As empresas também deixaram para trás
quilômetros de buracos escavados na terra, onde o mato já cresceu.
O Ministério da Integração alega que as obras são muito mais complexas
do que o imaginado no projeto inicial e que, até agora, na média,
avançaram 43%.
Segundo o governo, algumas construtoras encontraram custos bem mais
altos do que os previstos. Já em trechos construídos pelo Exército, no
município de Floresta, os trabalhos estão praticamente concluídos.
A obra avança sobre o lago de Itaparica para alcançar a parte mais
profunda do reservatório. Agora somente um trecho de aterro separa a
água com que os nordestinos tanto sonham do canal da transposição.
Mais adiante, operários constroem uma das estações de bombeamento necessárias para vencer os desníveis do solo.
A Barragem de Areias, que faz parte da transposição, está quase pronta, mas a estiagem não ajuda.
Era a água que restava para os animais. Hoje eles vêm, não encontram
nada e voltam para dentro do mato. O que há no local agora é um poço
cheio de lama onde os peixes lutam pela vida.
O replantio das mudas para substituir as plantas nativas arrancadas
pelas máquinas não vingou. A seca não poupa nada. E ela nunca pareceu
tão cruel quanto agora, no mesmo cenário de uma obra orçada em mais de
R$ 8 bilhões, por onde ainda não escorreu uma gota d´água sequer.
“A gente se sente frustrado porque é muito dinheiro público investido e
as obras ‘tudo’ abandonadas e paradas. A gente agora ‘tá’ com dúvida,
porque o descaso ‘tá’ muito grande, a gente fica com o pé atrás agora,
não dá mais para confiar”, desabafa o agricultor Manuel Joaquim da
Silva.
O Ministério da Integração Nacional declarou que vai realizar novas
licitações ainda este ano e que a meta é concluir a transposição do Rio
São Francisco em 2015.
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